Nunca o sistema penitenciário brasileiro esteve em tamanha
evidência. Desde que se deu conta do crescimento das facções dentro dos muros
dos presídios e do fato de que elas estão matando organizadamente fora deles,
não se via tamanho empenho no debate acerca das idéias e sugestões para a
solução do impasse. O direito de punir que veio paulatinamente sendo
transformado em sua concepção colonial de vingança do soberano em
técnica moderna de ressocialização, agora, no Brasil, precisa de pronta e
eficiente solução de recuperação que permita abrandar a violência que tomou
conta dos presídios e das ruas.
Aqui, foram erros seguidos: não foi possível cuidar da
separação adequada dos criminosos; não se deu conta que a reunião de
delinqüentes perigosos com quem tinha crimes mais singelos levaria a uma
distorção de grandes proporções e nem se percebeu, no tempo certo, que a
internação passou a ser indiscriminada e sem critérios.
Agora, para resolver a crise, de onde retirar recursos
financeiros se eles fazem falta em outros setores prioritários, como saúde e
educação, em um país de população pobre e carente? Uma experiência indiana
- atual e surpreendente - parece sugerir um caminho: em Tihar, nos
arredores de Nova Deli, na Índia, em um dos maiores estabelecimentos prisionais
do mundo contemporâneo, deu-se fato singular. Ali, em presídio de segurança
máxima, conhecido como um inferno sem solução, onde estão internados
mais de treze mil detentos, a criatividade de uma diretora, agindo sem recursos
e investimentos públicos do governo indiano, viabilizou a utilização de
técnica milenar consistente na exploração de meditação e estado
contemplativo por parte dos reeducandos, com a finalidade terapêutica de
livrá-los de seus sofrimentos pessoais, proporcionando-lhes melhor qualidade de
vida. A técnica de origem budista aplicada aos presos indianos acabou por levar
ao quase aniquilamento da reincidência, corrupção e uso de drogas nos
presídios onde está funcionando. Em razão do sucesso imediato, foi estendida
aos funcionários do estabelecimento e proporcionou a proliferação de cursos
periódicos em uma área especialmente criada para reflexão.
A transformação modelar da prisão Tihar nos
últimos treze anos da experiência acabou fazendo-a referência para outros
presídios indianos. Mais do que isso, atraiu a atenção de estudiosos e
pesquisadores do mundo todo sobre o fenômeno do controle das angústias das
populações carcerárias. Mereceu a atenção da psicanálise e da psiquiatria,
já que a reflexão não é técnica convencional de pacificação de
presidiários. Na verdade, a experiência abriu caminho inédito com a adoção
de solução prática e econômica para contenção dos problemas carcerários,
transformando a vida na prisão em rotina mais suportável e menos violenta.
Pode parecer estranho para os padrões ocidentais, já que a
realidade brasileira é bem diversa. Porém, se considerarmos que, no Brasil, a
falta de recursos públicos e a urgência para o encaminhamento da crise são na
essência, os mesmos problemas que em Tihar demandaram pronta solução,
será justo reconhecer que a experiência do presídio indiano é uma
demonstração forte de que o pragmatismo também é fator determinante no
encaminhamento de soluções. A experiência teve o mérito de se basear na
criatividade no trato com questões polêmicas e no enfrentamento da realidade
que permitiu, com o auxílio de métodos não convencionais de cumprimento de
pena, o abrandamento da crise. Trabalhou a acumulação das tensões que dominam
os ambientes carcerários, trazendo demonstração de que a vocação e a
criatividade das autoridades são fatores determinantes para tornar mais justa e
equilibrada a vida das populações carcerárias.
, porque os filhos deste mundo são mais prudentes na sua geração do que os filhos da luz. LUCAS 16/8
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