São Paulo é o estado que mais concentra presos de fora do país (1.960). Na sequência, aparecem Mato Grosso do Sul (189), Paraná (169), Rio de Janeiro (155) e Mato Grosso (112). Tocantins, Maranhão e Amapá são os únicos que não abrigam estrangeiros. A Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) registra 29,7 mil presos no Rio Grande do Sul, que ocupa a sexta posição no ranking, com 106 são estrangeiros, a maior parte procedente da Argentina e do Uruguai.
Diante das dificuldades, os que não têm ninguém próximo no Brasil, acabam, muitas vezes, se ligando a facções criminosas dentro dos presídios, segundo o juiz da Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre, Sidnei Brzuska. “Eles ficam dependentes de outros presos. Há alguns que não têm nem sequer escova de dentes”, observa, lembrando que os estrangeiros dividem as mesmas celas com os brasileiros. “Essas pessoas sofrem com o idioma, com a distância e com a superlotação, assim como os demais. Acabam aprendendo a falar Português na marra”, continua.
De acordo com Brzuska, a maioria das pessoas de fora do país, presa no Rio Grande do Sul, tem ligação com o tráfico. Ele disse que, por cometerem crimes internacionais, os estrangeiros costumam ser classificados como de alta periculosidade e são levados a cadeias de segurança máxima. “Na realidade, não passam de pessoas usadas por quadrilhas organizadas”, comenta, lembrando que o Rio Grande do Sul é considerado uma rota de tráfico internacional. Os criminosos costumam buscar drogas em outros países da América Latina e seguir, de avião, do Brasil para a Europa.
Sem visitas, presos ficam dependentes dos demais
Nos dias de visita – terças, quartas, sábados e domingos –, o superlotado Presídio Central de Porto Alegre fica cheio de companheiras, namoradas, pais, irmãos e filhos dos detentos. O uruguaio Solari, 29 anos, condenado a quatro anos e sete meses por tráfico, lamenta não estar em seu país, mais perto da mãe, do filho e dos amigos. Ele está confinado no sistema penitenciário gaúcho há 18 meses. O drama de Solari é igual ao vivenciado pelos mais de 100 estrangeiros encarcerados nas cadeias do Rio Grande do Sul.
Enquanto a maioria mata a saudade dos familiares semanalmente, Solari escreve cartas e sonha com o dia em que será transferido para o Uruguai. A mãe, que conseguiu vir à Capital poucas vezes, manda, pelos Correios, cópias de leis brasileiras e notícias do filho de Solari, hoje com 11 anos, afastado do pai há muito tempo.
Diferentemente de outros estrangeiros, Solari não teve dificuldade de se comunicar com os demais presos. Afinal, ele fala “portunhol”, pois já havia morado no Brasil anteriormente. O pai dele, que vive em Porto Alegre, o visita, vez ou outra, mas ele continua achando melhor voltar ao Uruguai. “As cadeias de lá são mais desorganizadas do que as do Brasil, mas eu quero voltar. Quando for libertado, pretendo trabalhar no meu país”, diz ele, que consegue comprar o que precisa no cárcere, com o dinheiro que recebe tatuando os companheiros de confinamento.
O Presídio Central abriga dez outros estrangeiros, além de Solari, misturados a 4,6 mil detentos. Cada um que vai chegando recebe ajuda dos outros. “A gente fala sobre as regras internas”, explica o chileno Castilho, 57 anos, preso pelo assassinato da companheira, morta a pauladas em Canoas. Segundo ele, um dos ensinamentos recebido quase três anos atrás e que repassa para os novatos é o de não olhar as visitas dos colegas de penitenciária. Diferentemente de Solari, e da maioria dos estrangeiros, Castilho é um dos poucos que recebe visitas frequentemente.
Os três filhos do primeiro casamento, nascidos no Brasil, não o abandonaram. Além disso, a ex-mulher, residente em Alvorada, também o visita. Castilho ainda não foi julgado pelo crime cometido. E, por conta disso, prefere não planejar o futuro.
Contudo, nem todos têm a sorte de Castilho. Apesar do auxílio dos presos, muitos não conseguem se adaptar às cadeias brasileiras. Ninguém esquece da passagem de um chinês no Presídio Central. “Ele foi preso por falsidade ideológica e não entendia nada do que falávamos”, conta o diretor da casa prisional, tenente-coronel Leandro Santiago. Segundo ele, nem Embaixada da China prestou muito apoio ao homem, libertado este ano. A maioria dos policiais militares e servidores penitenciários que trabalham nos presídios do Estado não é bilíngue, mas através de mímicas e de algumas palavras conhecidas do inglês, conseguiam passar algumas ordens ao asiático. “Ele observava a rotina e fazia o mesmo que os outros. Falava um pouco de inglês e a gente entendia algumas palavras”, comenta o tenente Nilton Tavares, que atua no local há sete meses e considera os estrangeiros mais disciplinados do que os brasileiros. Solari também conheceu o chinês. “Ele aprendeu a falar a palavra ‘bonito’ e só repetia isso”, lembra, sorrindo.
Transferência de presos é artifício para Justiça
Os crimes internacionais são acompanhados pelo Ministério Público Federal (MPF), que oferece denúncia e, ao mesmo tempo, procura garantir alguns direitos aos estrangeiros. O procurador da República Rodrigo Valdez de Oliveira observa que é preciso de um pouco de sensibilidade para tratar com esse tipo de caso. O Brasil pode pedir, por exemplo, a transferência ou a expulsão dos estrangeiros. Os delitos cometidos no país são julgados em território nacional e o condenado cumpre a pena no Brasil. Caso ele seja levado ao país de origem, não é possível controlar a detenção, a não ser que ela ocorra em uma das nações que mantêm acordo com o governo brasileiro, como Espanha, Argentina e Chile.
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