Estudar é direito da população carcerária do Brasil. A reinserção social dos detentos por meio do estudo é, na opinião dos especialistas, fundamental para mudança dessas pessoas. Os presídios brasileiros, no entanto, violam esse direito. Além da falta de condições mínimas de sobrevivência, aparente na crise do sistema prisional maranhense, o ensino só faz parte da rotina de 8,9% dos 548 mil presos do país.
Dados do Infopen, sistema que coordena as estatísticas do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, mostram que a maioria dos estados (20, incluindo o Distrito Federal) não oferece educação formal a 10% de sua população carcerária. No Amapá, nenhum presidiário– de um total de 2.045 – estuda. No Rio Grande do Norte, apenas 1,92% dos 7.141 presos têm acesso à educação. Dos 137 nessa condição, 66 estão se alfabetizando.
O Maranhão, que vive uma crise no sistema prisional deflagrada por causa de assassinatos dentro do Complexo de Pedrinhas, está entre os estados com menor oferta de reinserção social por meio da educação. Dos 5.417 detentos registrados no Infopen em dezembro de 2012, apenas 3,97% (215) estudam. A maioria (118 presos) está no ensino fundamental.
Entre os estados que possuem população carcerária mais numerosa, Minas Gerais lidera a estatística da exclusão dos presos do sistema educacional, de acordo com os dados disponíveis no Infopen. Do total de 51.598 presos sob a responsabilidade de prisões do estado, somente 1.908 estudam. Eles representam 3,7% dos detentos e a maioria deles também não avançou o ensino fundamental: 1.260 cursam a etapa.
Após a publicação da matéria, o governo de Minas Gerais procurou o iG para informar que a Secretaria de Defesa Social enviou números incorretos de presos estudantes para o Ministério da Justiça. Segundo o governo de Minas, a real quantidade de presos estudando em dezembro de 2012 (data utilizada na reportagem por serem os dados nacionais mais recentes disponíveis) era 6.017. Eles representariam 11% da população carcerária do estado."
Os dados nacionais revelam que 61,4% dos presos que estudam estão matriculados no ensino fundamental. São 29.117 estudantes nessa condição. Outros 8.392 (17,7%) alunos de presídios ainda tentam se alfabetizar. No ensino médio, estão matriculados mais 7.289 presos e 2.377 fazem cursos técnicos. Somente 178 (0,37% dos que estudam) conseguiram chegar à universidade.
Ester Rizzi, assessora da Ação Educativa, que realiza estudos sobre a educação em sistemas prisionais, acredita que há uma “visão forte” entre gestores e sociedade de que o ensino para presos é “privilégio”. “A violação do direito à educação é mais uma das violações que ocorrem no nosso sistema prisional. A pena no Brasil diz respeito à privação de liberdade. Os outros direitos – à educação, à saúde, à dignidade humana – têm de ser respeitados”, afirma.
Dificuldades
Segundo a pesquisadora, a estrutura física dos presídios é um dos grandes empecilhos para a oferta educacional nesses ambientes. Além disso, ela acredita que os gestores educacionais – e não de segurança pública – é que devem cuidar dessa oferta. Muitas vezes, não são professores das redes que ministram cursos para os presidiários. Em São Paulo, essa é uma mudança recente. “É um avanço porque as políticas chegarão a eles da mesma forma”, diz.
Ela lembra que as aulas e os materiais precisam se adequar ao contexto. Mas os parâmetros, inclusive de formação dos professores e objetivos de aprendizagem, têm de ser os mesmos para qualquer estudante. “Para a ressocialização deles, é fundamental a oferta de cursos de educação formal e não-formal. É um absurdo que tão poucos tenham acesso”, pondera.
Ester garante ainda que há outro mito em relação aos presos: o de que eles não se interessam pelos estudos. A Ação Educativa produziu uma pesquisa no ano passado, entrevistando os detentos, e constatou que, embora72% dos participantes da pesquisa não estivessem estudando, 86% afirmaram que gostariam de estudar. Mais da metade dos entrevistados nunca passaram por cursos formais na prisão.
Em 2009, uma missão coordenada pela pesquisadora Denise Carreira percorreu presídios do país para avaliar as condições educacionais desses locais. Após tanto tempo, muito problemas identificados por ela são os mesmos. Há falta de profissionais preparados para formar os presos de acordo com as necessidades deles, o trabalho é descontinuado muitas vezes, não há infraestrutura ou projetos pedagógicos adequados.
Além disso, o atendimento à população carcerária não mudou, no máximo, 20% dos presos estudavam. Hoje, Pernambuco é o estado que mais oferece educação formal aos detentos e atinge 25% deles.
Projetos de vida
Os dados do Infopen sobre o grau de instrução dos detentos não é muito preciso. De toda a população carcerária brasileira, que tem pouco mais de 548 mil pessoas, só há informações sobre a escolaridade de 513 mil presos. Quase metade deles (45%) não concluiu o ensino fundamental. Outros 5% são analfabetos.
Daniela Schoeps, coordenadora do projeto Educação com Arte, realizado pelo Centro de Estudos e Pesquisa em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) em parceria com a Fundação Casa, acredita que é preciso pensar em múltiplos fatores para garantir mudança de vida para essas pessoas. Com a arte, ela percebe (Daniela coordena um projeto de arte e cultura para adolescestes infratores) que eles descobrem potenciais.
“A escola tem um papel importante nessa trajetória, porque a educação tem uma relação grande com a capacidade de elaboração de projetos de vida. A educação tem de ser vista um conceito mais amplo, de forma integral, que inclui a cultura, a arte, o mundo digital”, diz. Os outros projetos, segundo ela, estimulam os jovens a se interessarem mais pelas aulas formais.
CHEGUE Á TUA PRESENÇA O GEMIDO DOS PRESOS; SALMOS 79/11
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