Elas chegam
em grupo, a maioria nos ônibus do Sistema Transcol que as trazem de
bairros de municípios distantes. Perfumadas, unhas feitas, calçam
chinelinhos coloridos, de plástico ou borracha, e vestem roupas leves,
sem decotes ousados. Trazem nas mãos toalha e lençol brancos, e um
pequeno pedaço de sabonete. Nos rostos, um misto de alegria contida e
uma visível ansiedade para um encontro amoroso carregado de paixão, e
que foge totalmente ao convencional.
Um encontro íntimo, dentro
de um ambiente temido e, porque não dizer, rejeitado, por muitos: o
presídio. Ali, envolvem-se em abraços, beijos, carinho, sexo, tudo junto
e misturado, literalmente, atrás das grades.
A balconista Maria (nome fictício, condição imposta pelas
mulheres de presos nesta reportagem), 31, fala com empolgação da sua
próxima visita íntima, que coincidirá, nesta terça-feira, com o Dia dos
Namorados.
Ela não levará presente, porque malote não entra em
presídio, e ainda não definiu a cor, mas sabe que vai entregar-se ao
marido, preso por homicídio há sete anos, usando, pelo menos, uma
calcinha nova. Ah, também escovará os cabelos, parte de sua estratégia
de sedução.
Como ela o vê? “Como um bom homem, marido carinhoso,
ótimo pai”, apressa-se em defini-lo, di zendo baixinho: “Queria muito
estar com ele, neste Dia dos Namorados, mas lá em casa, no nosso
quartinho”. Esse dia, porém, está longe de acontecer: o amor de Maria,
condenado a 23 anos por um homicídio, ainda será julgado por um segundo
assassinato, júri que ela, “com fé em Deus”, acredita que o inocentará.
Sensações
Durante três dias, A GAZETA
ouviu algumas dessas mulheres que mantêm encontros íntimos com seus
companheiros presos em uma das unidades do Complexo Penitenciário de
Xuri, em Vila Velha, onde estão cerca de 700 homens.
Em todo o
sistema prisional estadual, os encontros acontecem em dias e horários
previamente marcados, em ambientes dotados de banheiro e camas de
alvenaria. E, é claro, são cercados de muita expectativa, como explica a
trabalhadora de serviços gerais Fátima, 34, cuja história poderia
compor uma novela.
Fátima, que está no sexto mês de gravidez, conheceu seu marido,
preso por associação para o tráfico, há três anos, quando ele, após
escolha aleatória de um número, ligou para o telefone celular dela.
Com
o homem, que estava em Linhares, ela conversou durante um ano, até que
os dois se encontraram, e ele lhe revelou: era foragido do sistema
semiaberto (aquele em que o condenado só volta para a prisão à noite).
“Estava
viúva há quatro anos, e fui me envolvendo com as nossas conversas.
Quando soube que ele era um foragido, já estava apaixonada”, diz ela. O
casal morou junto por dois anos e quatro meses, até ele ser recapturado
pela polícia, o que aconteceu há quatro meses, com Fátima já no segundo
mês de gestação.
Agora, ambos aguardam pela libertação dele, que
deve acontecer, segundo ela, em dois anos. Até lá, só podem se ver a
cada 21 dias, nos encontros íntimos, e de 15 em 15 dias, nos encontros
sociais, onde as famílias – mulheres, pais, irmãos, filhos – visitam os
internos. Nesses dias, nada de beijos calientes e abraços idem.
Discrição é a regra.
Chama
O fogo da
paixão só é mesmo permitido entre quatro paredes, e o tempo de duração é
determinado: apenas uma hora. Há quem admita que não é fácil relaxar
nessas visitas, precedidas de todo um ritual de segurança ao qual as
mulheres são submetidas.
A começar pela atenção às regras do
vestuário (ver quadro na página ao lado), que incluem proibição do uso
de sutiã com bojo, incluindo aquele com reforço de pequenos ferrinhos,
responsáveis por deixar as mulheres com seios mais empinados. É que num
presídio, um pequeno ferrinho pode virar uma arma...
Mas o
constrangimento maior, admitido pelas mulheres, acontece durante a
revista. Para ter acesso ao “ninho de amor” no presídio, elas têm que
ficar nuas, e sentar em um banco detetor de metal. Na semana retrasada, o
banco, por uma falha, apitou quando Luíza, 21, sentou-se nele.
Para
garantir que não carregava nada no interior do seu corpo, foi
determinado que ela fizesse vários agachamentos. “Fiquei muito irritada,
e cheguei nervosa no encontro com meu marido”, desaba.
Na saída do
quarto, novo procedimento de revista, e novo apito, o que livrou Luíza
de um flagrante. “Se eu tivesse levado algo para ele o banco não
apitaria mais”, disse a mulher, que tem uma filha de 5 anos com o
marido, preso pela segunda vez, agora por tráfico de drogas.
Sob tensão
“A
presença de agentes, no corredor, faz com que a gente não relaxe”, diz
ela, referindo-se aos momentos de amor entre quatro paredes do presídio,
bloqueio do qual Fátima diz tentar livrar-se dando asas à fantasia.
“Sou
romântica, e tento curtir ao máximo quando estou lá dentro. Ali, fecho
os olhos e imagino que estou num motel cinco estrelas”, diz, entre
sorrisos.
Helena, 24, namorava com o seu hoje marido quando ele
foi preso por tráfico, há quatro anos. Há um ano, tiveram uma filha,
porque o casal queria fortalecer ainda mais o vínculo que os unia.
“Hoje
não fico mais sozinha, porque tenho minha filha. E ele sonha em sair do
presídio para cuidar dela. Sabe, a prisão até o ajudou: o fez gostar de
ler livros”, diz Helena.
Dúvida cruel
Amiga
de Helena na adolescência, Roberta, 23, nunca imaginou que as duas
pudessem se reencontrar na porta de um presídio, anos depois.
Pois
foi o que aconteceu, após Roberta ter sido “localizada” pelo homem com
quem mantém uma união estável registrada em cartório. “Mudei para
Brasília, ele se casou, se divorciou, até que, três anos depois, voltei
para o Espírito Santo e um amigo me disse que ele queria muito me ver.
Fui encontrá-lo na prisão”, diz a comerciária.
O casal esperou
seis meses para ter direito à visita íntima. E Roberta admite: na
primeira vez, se sentiu “uma bandida”. Até hoje, na hora da revista,
olha para o chão. “É humilhante”, diz, ao revelar o sonho do marido: ter
um filho com ela.
Cautela
Faltam nove anos para o homem sair da
prisão, onde está por tráfico e porte ilegal de armas, e Roberta,
olhar perdido, admite sua preocupação em relação à decisão de pôr um
filho no mundo. “Às vezes, fico pensando: com tanta mulher bonita,
sarada, aqui fora, será que quando ele sair da prisão ainda vai me
querer?”.
Psicóloga e diretora de Ressocialização da Secretaria
da Justiça, Quesia da Cunha Oliveira alerta sobre o fato de um filho ser
uma decisão séria, e lembra que “presídio não é um lugar para se tomar
uma decisão que impacte uma vida inteira”.
Mas destaca a importância dos encontros nas cadeias, um direito legal assegurado aos detentos.
“Para
quem está longe do contato afetivo e físico, o sexo tem uma dimensão
maior, porque todas as outras fontes de prazer estão privadas. É
necessidade do ser humano, mas, especialmente no sistema prisional,
requer um olhar técnico, comprovação de vínculo afetivo anterior à
prisão. E devemos lembrar da necessidade de o Estado oferecer condições
dignas às pessoas, com espaço adequado, higiene”, diz a psicóloga.
De
higiene as mulheres não se queixam. Para os encontros, têm que levar
toalha e lençol brancos, e sabonete – cortado, mais uma medida de
segurança.
“Levo sempre um bem cheiroso”, diz Penha, 40, cujo
marido tem 26. “Dois meses depois de nos conhecermos, já estava
grávida”, admite a mulher, que chegou a ser presa duas vezes, por causa
do envolvimento do companheiro com o tráfico. Mas foi inocentada.
Olhos brilhando, momentos antes de encontrá-lo, o elogia: “Ele é bom pai, bom marido, tem boa índole”. Certezas do amor.
Rigidez na triagem
Regras
Vestuário
Tanto nas visitas íntimas quanto nas sociais, que
acontecem no final de semana, o visitante não entra nas unidades
prisionais do Estado se estiver usando:
Roupa preta
Roupa curta
Com bojo
Jeans
Roupa com zíper
Roupa com ferro ou metal
Sapato alto
Sapato com salto plataforma
Sapato fechado
Tênis
Cinto
Joias, bijuterias e piercings
União
Oficial
Segundo a Secretaria de Estado da
Justiça, as visitas íntimas só são autorizadas para as pessoas casadas e
com união estável registrada em cartório.
Os não casados, mas com união anterior à prisão, têm o vínculo comprovado com certidão de nascimento de filhos em comum.
No
caso de o casal não ser casado e nem ter filhos, é feita uma
investigação social para confirmar esse vínculo. Isso pode ser feito com
fotografias, cartões de crédito e contas bancárias conjuntas, entre
outros comprovantes.
O meu amado e meu ,e eu sou dele CANTARES CAP.2 VERS 16
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