quinta-feira, 24 de maio de 2018

PUNTA DE RIELES , O PRESÍDIO URUGUAIO QUE E UMA CIDADE .


Os prisioneiros do presídio uruguaio Punta de Rieles se comprometem com seus próprios negócios, circulam livremente e têm o seu próprio programa de rádio.
A administração da prisão, localizada na periferia de Montevidéu, é operada por civis. Os soldados que guardavam o perímetro tornaram-se dispensáveis, uma vez que a nova gestão transformou a prisão em uma “aldeia”, e desde então nenhum prisioneiro tentou escapar.
Esse modelo, segundo reportagem da VICE Notícias, conseguiu reduzir a taxa de reincidência de presos a 2% contra uma média nacional de 50%.
Lá, um prisioneiro não precisa esperar sua pena terminar para procurar trabalho e pode começar seu próprio negócio. Tanto que dos 500 presos, a maioria trabalha em uma das 35 empresas que operam dentro da prisão.
Para tornar os empreendimentos possíveis, eles possuem também uma instituição financeira, cuja comissão administrativa é composta por funcionários prisionais e detentos que decidem algumas das iniciativas mais importantes para os negócios.
Oferecem crédito para que as ideias arovadas tornem-se realidade. O financiamento é feito através da cobrança de impostos, um valor de 20% sobre os lucros das empresas já em funcionamento.
Os detentos não podem lidar com dinheiro, então apenas clientes externos podem comprar os produtos das lojas ou os familiares adquirem bilhetes comprados na entrada da prisão e que podem ser trocados por mercadorias.
Este sistema de “moeda” interna foi inventado por Fabían, um dos prisioneiros e dono da confeitaria. “Continuamos a pensar, você viu?” A confeitaria oferece serviços para festas e eventos fora da prisão.Todos os benefícios e salários são depositados ou no banco da prisão ou em uma conta escolhida pelo preso, que pode escolher também entre poupar ou ajudar a família com as despesas do lado de fora.
“A prisão foi concebida para funcionar como um povoado, ser o mais próximo possível de uma aldeia. A ideia é aproximá-los da realidade que vão encontrar quando recuperarem a liberdade”, explica Luis Parodi, diretor da prisão em entrevista à VICE.
Entre os empreendimentos que já funcionam no local, fábricas de tijolos, lojas de produtos de saúde, empresa de reciclagem e impressão, supermercado, padaria, cabelereiro, escolas (onde os professores do Ministério da Educação lecionam), entre outros. Inclusivo, hoje, 90% dos prisioneiros frequentam os estudos.
80% das empresas em Punta de Rieles são de prisioneiros. Há também detentos que trabalham para o Estado.
Além disso, eles comandam também uma rádio, que transmite um programa online de entrevistas e músicas.
Há ainda um templo para práticas religiosas e, como em toda cidade, uma praça principal onde acontecem reuniões para conversar com seus moradores.
A transformação desta prisão não foi uma tarefa fácil. “Esta compreensão da gestão de uma prisão colidiu frontalmente com a concepção da polícia da prisão na hora de realizar a mudança”, lembra Arbesun. Esta realidade, aliada à corrupção de alguns agentes, resultou na expulsão de 25 policiais que operavam em Punta de Rieles.
Finalmente, Arbesun e Parodi, que na época era o vice-diretor da prisão, decidiram que a gestão interna seria feita exclusivamente por civis e restringiu o papel da polícia a avaliar as entradas e saídas.
A prisão de Punta de Rieles é também é pioneira em termos de liberdade de movimento e comunicação de seus prisioneiros, que vão de um lugar para outro, sem restrições e podem usar seu próprio celular.
As celas, que são para 6 ou 4 pessoas, são usadas apenas para dormir e algumas delas ficam abertas 24 horas. Por sua vez, foram projetados locais individuais para que os detidos possam ter um espaço de privacidade.
“Não existe uma fórmula mágica para resolver situações de violação das regras de convivência ou de confronto, a nossa principal ferramenta de trabalho é saliva, nós gastamos muito, mas um monte de saliva para tentar chegar a uma solução pacífica. Nós priorizamos o aspecto educativo, ou seja, discussão, raciocínio… a disciplina é sempre o último recurso “, diz Arbesun.
“Você tem que alimentar a alma, preencher o pensamento, para alimentar os sentidos”, diz Arbesun.
Você pode conferir o documentário sobre esse presídio único no mundo, produzindo por Danio Barreto, um dos operadores da rádio. “Cambio de Vida” conta a história de alguns detentos e sua reabilitação.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

BRASIL TEM MAIS DE 200 BEBÉS VIVENDO EM PRESÍDIOS COM A SUAS MÃES ..


A ministra Cármen Lúcia, presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou aos tribunais do País que fossem registrados e vacinados imediatamente os bebês que vivem nas cadeias brasileiras.
A medida atingiu diretamente as crianças mantidas no cárcere do Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa, em Aquiraz/CE, a 32 quilômetros de Fortaleza, onde a equipe do CNJ detectou 11 crianças sem registro civil e um bebê nascido em Sergipe, onde sua mãe cumpria pena no Presídio Feminino Nossa Senhora do Socorro, na cidade de mesmo nome, a oito quilômetros da capital, Aracaju. 
A real situação das presas gestantes e lactantes está sendo revisada pelo CNJ que, desde o dia 18 de janeiro, vistoriou 22 estabelecimentos penais, em 15 Estados e no Distrito Federal, verificando o tratamento dado aos bebês, às gestantes e às lactantes. A última inspeção ocorreu no dia 23 de fevereiro.
A equipe designada pela ministra Cármen Lúcia para visitar os presídios também identificou cinco crianças sem registro no Centro de Reeducação Feminino, no Pará. Na Penitenciária Feminina do Distrito Federal, as duas crianças que não possuíam registros tiveram seus documentos regularizados após visita do CNJ, ocorrida no último dia 19.
São Paulo é o Estado com maior número de crianças sem registros: são 14 pendentes de identificação. No Brasil, existiam 373 grávidas e 249 lactantes encarceradas em dezembro de 2017, segundo o Cadastro Nacional de Presas Grávidas e Lactantes, criado pelo CNJ. O Cadastro vai permitir que o Judiciário conheça e acompanhe, continuamente, a situação de mulheres nessas situações, submetidas ao sistema prisional brasileiro. 

Vacinas

A preocupação da ministra também se estendeu às crianças sem vacinas. No DF, durante a inspeção, foram identificadas quatro crianças sem a dose da chamada BCG (para prevenção da tuberculose). Após a visita da equipe do CNJ, segundo informações da Vara de Execuções Penais (VEP), a situação foi regularizada.
Em Ananindeua, no Pará, a vacinação de uma criança também está atrasada. Nos ofícios encaminhados pela ministra foi determinado que, no futuro, quando for encontrada situações dessa natureza, os problemas sejam imediatamente resolvidos. A dificuldade no acesso à saúde da mãe e da criança foi constatada em todos os presídios femininos visitados.
Nas mensagens aos tribunais, Cármen Lúcia determina que “situações futuras de falta de registro, bem como a vacinação das presas gestantes e dos filhos das lactantes custodiadas no sistema prisional, sejam observadas e resolvidas pelos juízes competentes durante a realização de inspeção de estabelecimentos prisionais femininos ou mistos”.

Visita

A equipe do CNJ contatou pessoalmente 311 das 622 mulheres nessas condições, dentro dos presídios. Encontrou mães e bebês em acomodações precárias e recebendo alimentação inadequada, além de unidades com crianças ainda sem o registro de nascimento.
Na maioria dos locais visitados, constatou-se não haver ginecologistas ou obstetras acessíveis para o atendimento pré-natal das grávidas, nem pediatras disponíveis para os recém nascidos que vivem nas cadeias brasileiras. Em algumas unidades foram encontradas, por exemplo, crianças com vacinação atrasada.
“O que faz a diferença entre uma e outra penitenciária é o empenho de quem está na direção do estabelecimento penal para cumprir a lei e utilizar adequadamente os recursos do fundo penitenciário, disponibilizados pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional) e pelas secretarias de Administração Penitenciária”, disse a juíza auxiliar da presidência do CNJ Andremara dos Santos, que coordenou as visitas aos presídios. 
Segundo a juíza, apesar de existir uma política pública de assistência à saúde no Sistema Prisional, que prevê a instalação de unidades básicas de saúde (UBS) nos complexos penais e espaços materno-infantis, nem todas as unidades dispõem dos recursos. “Em São Paulo, por exemplo, algumas unidades têm brinquedoteca, berços e carrinhos de bebês disponíveis para as lactantes cedidos pelo Depen.
Em outras unidades, como no Mato Grosso do Sul,  encontramos estes equipamentos encaixotados. Em outras, como no DF, nem isso. Os berços encontrados na unidade da capital foram doados pela VEP (Vara de Execução Penal)”, disse a juíza. 
A primeira visita do CNJ aos presídios com grávidas e lactantes ocorreu em janeiro, em Vespasiano/MG, com a presença da ministra Cármen Lúcia. A ministra tem dito, em várias oportunidades, que “presídio não é local apropriado para uma criança se desenvolver”. [Acesse aqui para ler matéria sobre essa visita. A última visita do CNJ às mães e lactantes em presídios ocorreu na Colônia Penal Feminina do Recife, em 23 de fevereiro.

Marmita podre

No Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF), apesar da política de inserção social ser um ponto positivo do presídio (dezenas de detentas trabalham e estudam, conseguindo remição da pena), a equipe do CNJ ouviu queixas das mulheres privadas de liberdade em relação ao descaso com os acompanhamentos médicos e com a qualidade da alimentação. 
O CNJ constatou baixa qualidade da comida e falta de fiscalização em relação à dietas oferecidas às lactantes, aos bebês e às grávidas. Sopa com muita gordura, alimento com muito sal, marmita estragada ou sem cozimento adequado foram os problemas mais lembrados. “O frango quase sempre chega cru. Ou você come, ou fica com fome. Não há substituição do alimento, nem quando está estragado”, relatou uma presa. 

Exceções

Foram identificadas também realidades positivas em meio ao caos penitenciário. Na Penitenciária de Cariacica/ES, o cuidado com a alimentação das presas surpreendeu a assessora da Presidência do CNJ Luisa Cruz, que participou das inspeções.
“Lá existem nutricionistas para adequar as dietas dos bebês, das grávidas ou das lactantes. Conferimos o cuidado com a alimentação, cada qual com sua dieta própria”, afirmou Luisa.  Ela também citou que no Presídio Feminino Santa Luzia de Maceió, capital de Alagoas, a unidade materno-infantil possui uma instalação básica de saúde devidamente equipada e em pleno funcionamento.
Para a juíza Andremara dos Santos, “existem estabelecimentos penais que priorizam e investem no acolhimento de mães e bebês, mas esses são minoria”.

Improvisação

“Encontramos muita improvisação. Desde o trabalho de aproximação com as famílias, até o momento da entrega dos filhos”, diz a juíza do CNJ, em relação à falta de padronização de procedimentos na aproximação das famílias com os bebês, que antecedem a entrega das crianças. 
Pela lei, as crianças têm direito à amamentação nos primeiros seis meses de vida. Após essa fase, são separadas de suas mães, que voltam ao cumprimento regular de suas penas. Os bebês podem ser encaminhados às famílias de origem ou a famílias substitutas.
A maternidade das presas também passa por outro desafio: em geral, elas já são mães de outras crianças.
“Enquanto as mães pagam suas dívidas com a sociedade, os outros filhos ficam com vizinhos e avós ou são encaminhados para lares substitutos. Não raramente vão parar em abrigos. O processo é muito doloroso e, na maioria das vezes, não é acompanhado pela Justiça da Infância e Juventude nem pelo Conselho Tutelar”, constatou Andremara dos Santos.  
Os problemas encontrados nas prisões, com depoimentos das custodias, integram um relatório a ser apresentado à ministra Cármen Lúcia. “É preciso muita responsabilidade na gestão de um presídio. Presídio não é depósito de seres humanos”, observa a juíza Andremara dos Santos. 

Pastor Hugo Daniel evangelizando as mulheres encarceradas no Estado do Paraná .